“Me sinto uma guardiã da natureza”

Construindo um futuro urbano de mãos dadas com o meio ambiente
Marcela Toledo foi criada por uma família intimamente ligada à natureza. Nascida em São João da Barra, município de 36 mil habitantes da região Norte Fluminense do Rio de Janeiro, ela tem em suas raízes a agricultura familiar e a pesca artesanal. Desde cedo, aprendeu a valorizar e preservar o meio ambiente, essencial para a subsistência e o sustento de seus familiares.
Sua primeira formação foi em história, movida pela ânsia de conhecer o ado para pensar nas ações do presente. ou a lecionar para jovens do município e do estado.
“Com a experiência, tornei-me secretária de Agricultura e, nessa época, colaborei com diversos projetos voltados para a sustentabilidade ambiental e a produção agroecológica.”
Foi uma virada que veio para ficar. Em 2020, Marcela prestava assistência às pessoas afetadas pelas enchentes que ocorreram no município, mantendo um olhar atento para o meio ambiente. Foi então que ela ou a liderar a Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Serviços Públicos de São João da Barra, cultivando um extenso currículo que inclui estudos em gestão ambiental, recursos hídricos e gestão de resíduos sólidos.
“Me sinto uma guardiã da natureza, como os povos originários que defendem seu território e sua natureza, entendendo que o ser humano é parte do meio ambiente e não superior a ele. Somos tão importantes quanto os outros agentes que compõem nosso ecossistema. Estar à frente da secretaria é uma oportunidade de materializar esse sentimento e ampliar o raio de atuação que eu teria individualmente como cidadã.”

Ciclo Verde
Como herança de sua história com a agricultura familiar e a percepção sobre os desafios ambientais da região, ela esteve à frente da criação da iniciativa “Ciclo Verde: gestão de resíduos sólidos e recursos hídricos em São João da Barra”. O projeto implementa um sistema de trituração de resíduos da construção civil e da poda de árvores para reaproveitamento na agricultura familiar e em obras públicas – inovação que economiza recursos públicos, evita o descarte irregular e promove a economia circular.
Os resíduos da construção civil são destinados para diferentes usos dentro do município, sendo reaproveitados em obras públicas e na recuperação ambiental. Isso envolve a pavimentação de estradas, a estabilização de encostas e o controle de erosão.
Além disso, o projeto também reduz a irrigação nas propriedades rurais por meio da trituração de resíduos da poda de árvores, o que contribui para evitar o desperdício de recursos hídricos na produção agrícola e na drenagem. A retirada de resíduos das ruas para reaproveitamento não apenas melhora a limpeza urbana e previne a obstrução das galerias pluviais, mas também reduz os impactos das mudanças climáticas e promove o uso eficiente de materiais que seriam descartados.
A gestora conta sobre como é importante o processo de troca com população local na implementação da iniciativa. "O conselho ambiental é o espaço de diálogo entre a gestão ambiental e a comunidade. O Ciclo Verde é uma resposta aos anseios já manifestados pelos produtores rurais. É nesse espaço que incentivamos práticas sustentáveis mais adequadas, como a conscientização sobre o uso de agrotóxicos e o descarte correto de embalagens, com a implementação de uma política reversa para sua coleta”, afirma Marcela.
Desafio dos ODS
Em novembro, a iniciativa de Marcela foi reconhecida pelo ONU-Habitat. Ela foi vencedora da categoria “ODS 11: Territórios Resilientes” do Desafio dos ODS, que premiou dez soluções criativas para problemas locais relacionados ao alcance dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).

A iniciativa foi promovida pelo projeto Rio Inclusivo e Sustentável, parceria do ONU-Habitat com o Governo do Estado do Rio de Janeiro por meio da Secretaria de Ambiente e Sustentabilidade para promover a resiliência climática nas 92 cidades do estado. Ao longo de seis meses, o Desafio dos ODS mobilizou mais de 500 servidores de 86 municípios e nove comitês de bacia hidrográfica do Rio de Janeiro para aprender sobre a Agenda 2030 e o papel dos governos locais na sua implementação. Marcela estava entre eles.
Na primeira etapa, a Jornada do Desafio promoveu 13 encontros presenciais em nove regiões hidrográficas, incentivando soluções inovadoras e a integração entre municípios. A segunda etapa, o Laboratório Virtual, contou com oito reuniões online para aprofundar temas essenciais para o alcance dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável. Ao final, o concurso de boas práticas premiou as iniciativas com maior impacto e potencial de replicação. Os dez premiados foram anunciados em uma cerimônia durante o G20 Social, em novembro.
Segundo a subsecretária de Recursos Hídricos e Sustentabilidade do Governo do Estado do Rio de Janeiro, Ana Asti, essa iniciativa representa um marco na política pública de trabalho com as cidades:
“A parceria do Governo do Estado com o ONU-Habitat traz a possibilidade de um diálogo especializado sobre os territórios e de uma reflexão sobre como as cidades do Rio de Janeiro estão preparadas para territorializar sua agenda de sustentabilidade. Todas as experiências e melhores práticas fruto dessa parceria trazidas de outras regiões, tanto do Brasil quanto de outros países, acabam sendo um manancial de possibilidades e projetos a serem aplicados no estado do Rio de Janeiro, adaptados às vocações e características locais, impulsionando a transformação para uma agenda positiva e propositiva da sustentabilidade.”
União regional
Como gestora pública, Marcela comenta as dificuldades de trabalhar a Agenda 2030 e os ODS de forma integrada e prioritária nos municípios diante de demandas urgentes como os crimes ambientais. Para ela, a participação no Desafio dos ODS foi fundamental para ampliar a discussão sobre essa temática na cidade e para aprofundar o conhecimento das equipes locais na busca pelos ODS.
Marcela destaca que o grande valor das iniciativas e da vitória na premiação está na possibilidade de aplicação dos conhecimentos em outros municípios. “O portfólio de iniciativas estará ível para que todos possam acompanhar como os municípios estão repensando e aprimorando suas estratégias de atuação”, afirma a gestora.
Um dos momentos mais marcantes para Marcela foi a interação com o município de Campos, vizinho de São João da Barra, que solicitou seu apoio para se candidatar ao concurso. Para ela, a prioridade era a colaboração e parceria, mesmo entre concorrentes do concurso. A participação de mais municípios próximos era do seu interesse para ampliação da visibilidade da região.
"Queríamos que todos fossem vitoriosos. Somos o único município vencedor na região Norte e Noroeste do estado, e representar essa região foi muito significativo para mim. Estar no G20 Social não é apenas sobre São João da Barra, mas sobre minha região como um todo. Me senti representante de um grupo maior."
Para além do concurso, ela vê uma continuidade na integração entre os municípios em prol da construção de um estado mais resiliente, o que ganha força através do projeto. Ela destaca que existe uma crescente sensibilidade para uma gestão ambiental vista de forma conjunta.
"Ao lançar um projeto que oferece capacitações e apoio aos municípios, promovendo inclusão e visibilidade, estamos criando um momento de integração. Mais do que uma ação pontual, trata-se de um processo contínuo."
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